quinta-feira, 6 de outubro de 2011

PAINÉIS DE SÃO VICENTE, A QUESTÃO

B) CONTINUA POR AQUI…


Apenas em 1909 e mercê dos muitos esforços efectuados desde 1905, José de Figueiredo teve a alegria de assistir à apresenta­ção, em sessão da Comissão Executiva da Academia Real de Belas-Artes, de uma carta na qual se dava conta da dis­posição do Conde dos Olivais e Penha Longa (em custear os trabalhos relativos à conservação das tábuas. Luciano Freire (pintor, profes­sor de Desenho e Secretário da A.R.B.A.) seria nomeado como responsável pelo trabalho de tratamento e integração das pinturas, depois de obtida a autorização do Patriarca D. António Mendes Belo e o despacho favorável do Ministro da Fazenda). Ficou assim possibilitada a saída das pintu­ras de S. Vicente para a Academia.
Numa oficina do antigo Convento de S. Francisco, Lu­ciano Freire levou a cabo a sua tarefa, concluída na Primavera de 1910. E, de acordo com Luciano Freire, logo que os quadros ficaram libertos das repinturas sucessivas e de enegrecidos vernizes, verificou-se que se tratava de dois trípticos,  como afirmou “nem foi assunto que nos tivesse merecido a menor contro­vérsia. A lógica absolutamente de acordo com as con­dições materiais dos painéis assim o determinava peremptoriamente... Libertados os quadros das camadas parasitas, apare­cendo a obra de arte no seu esplendor de conjunto, inicial, e desmascaradas algumas das fisionomias das personagens que ali figuraram...”[1]
Por seu turno, o trabalho efectuado por Luciano Freire revelara pormenores que corroboravam as suposições de José de Figueiredo relativamente: 1) à época — reinado de D. Afonso V; 2) ao autor — Nuno Gonçalves; e 3) aos vários e suces­sivos arranjos sofridos pelos painéis — 1356; depois de 1531, por ordem do Arcebispo de Lisboa, D. Fernando de Vascon­celos (1540-1564); primeira metade do século XVII (1631); e outro no começo do século XIX.
Com os dados que possuía, José de Figueiredo identificou várias personagens representadas nos painéis e ordenou as tábuas — agora em número de seis, após o tratamento de Luciano Freire — em dois trípticos, atribuindo a cada tábua as desig­nações (da esquerda para a direita) de: Painel dos Frades, Painel dos Pescadores, Painel do Infante, Painel do Arcebispo, Painel dos Cavaleiros e Painel da Relíquia. A figura central era identificada como S. Vicente, patrono de Lisboa e das vitórias, apresentado com dalmática e manípulo fazendo-se acompanhar por alguns elementos passíveis de relacionar com a sua lenda: rolo de cordas, relíquia e caixão. Notava-se porém a ausência de certos atributos daquele santo, como o barco e os corvos, estes últimos considerados imprescindíveis na representação de S. Vicente. Ainda assim, José de Figueiredo não abdicava da sua identificação, alu­dindo à existência possível de uma predela (embora desco­nhecida) contendo a representação dos corvos para comple­tar os símbolos identificativos do santo.
A contemplação dos painéis, leva-nos a concluir que estamos perante uma obra única, profundamente original e intrigante. A grande aglomeração de figuras preenchendo todo o espaço disponível, sem um único intervalo que permita discernir claramente algum fundo através da parede humana que se estende de um extremo a outro, a distribuição das figuras em planos sucessivos até aos topos dos painéis, os objectos obviamente carregados de simbolismo não imediatamente compreensível, são os primeiros elementos visíveis de um mistério que se arrasta desde o fim do séc. XIX. (Fig.1)[2]

Fig. 1 –Painéis

O primeiro problema que se põe é, naturalmente, o da colocação correcta dos painéis, e os mais importantes elementos para a sua determinação encontram-se não só na inclinação progressiva das linhas formadas pelas lajes do pavimento, como ainda nas medidas diferentes dos painéis individuais. E, parece ser esta a disposição inequívoca. (Fig.2)[3]


Fig. 2 – Posicionamento dos Painéis
                                                                                         


[1] GONÇALVES, António Manuel – Do Restauro dos Painéis de São Vicente de Fora, p. 83
[2] MARQUES António Salvador –www.painéis.org
[3] MARQUES, António Salvador – cit. 9

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